O título do post é nosso, mas a partir daqui é uma mostra do que vai cotidianamente no blog Notícias do Interior - em todos os sentidos, de Bernardo Guimarães, pilotado a partir de Ituberá.
Quarta-feira, 22 de Outubro de 2008
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Vida de médico no interior me proporciona o inusitado. Hoje morreu um conhecido, mas não tinha intimidade suficiente para ir ao velório. Além do mais continuo achando esquisito, médico comparecer a velório; fica parecendo que foi conferir seu erro, mesmo não sendo. No mínimo todos pedem para medir a pressão. Não escapei. Fui pego pelo braço, na rua, chamado às pressas: o defunto estava respirando! "Podia ser pior", pensei, já que respirando é que não deve estar mesmo! Na dúvida, não levei o tensiômetro. Velório do interior: fora, os amigos bebiam o morto descaradamente, em homenagem ao biriteiro que partia. Dentro, a família louca para me ouvir dizer que, realmente, o morto estava vivo.
- Tá saindo umas bolhinhas pelo nariz, pocando assim: poc...poc...Ajeitei os óculos e conferi: saía, de fato, umas bolhinhas tipo de sabão, do nariz do defunto.
Quem tem sangue fraco, interrompa aqui a leitura.
Havia secreção nasal, que os gases internos, já produzidos em profusão, transformavam em bolhas. poc...poc. Explicação científica dada, uma pelota de algodão em cada narina e, missão cumprida.
Parece mentira de contista, mas tenho dezenas de testemunhas: fui novamente agarrado pelo braço, na porta, por um rapaz desesperado:
-Doutor, minha mulher está parindo! Seis casas depois de uma morte, uma vida chegando. Cheguei a tempo de avistar a jovem de 17 anos, pernas abertas, cara de pavor e uma cabeça pra fora. No instinto segurei a cabeça e ela rodou. Duas manobras e o menino já estava sobre a barriga da mãe. Feliz e aliviada, ela nem sentiu quando tirei a placenta. Deus protege os inocentes: primeiro filho, um casebre de tábuas, sobre uma cama, uma unica lâmpada para toda a casa e um médico na porta. O garoto chorou bonito e a menina não teve uma rotura sequer! Gente pra ver o caco, na porta, metade vinda do velório, esperando o resultado. Quando ouviram o choro, pipocaram a aplaudir. Do Posto de Saude mandei vir o estojo de curativos e terminamos os procedimentos. Na saída ainda tomei uma, com o pai todo orgulhoso. Entrando no carro, recebi o pagamento pela voz trêmula de Leidiane, saindo pela fresta da parede:
-Deus lhe abençoe. Dia ganho.
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